Confesso: não pude desamar de ti.
Tornei-me, então, tua mãe.
Afinal, não serias o meu homem,
eu sabia. Não vacilei, e dedico-me
à condição mais intestina,
mais doce – a de quem cozinha,
cose, espera, cala, tece,
aconselha, espera, vela
(mesmo que não, é como se fosse),
à condição de quem vê passar
o tempo no cabelo, nos gestos,
nas histórias, nos amigos, nos dentes
do seu pequeno príncipe, do seu dolorido,
do seu príncipe feliz.
Porque não me querias como homem,
porque não poderia ser teu pai,
restou-me não ser menos que este amor
que segue ao teu lado
mesmo quando é tão distante teu caminho,
teu silêncio, teu passo rápido, teu sonho.
Choro,
que o destino das mães é sempre triste.
Porque é triste não poder ser
a mulher do seu menino.
FERRAZ, Eucanaã. Rua do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.