Durante todo esse tempo não escrevi nada. Não havia escrito nem estava escrevendo nada. Não havia nada dentro de mim que precisasse ser escrito. Nada precisava de qualquer palavra e não havia palavra alguma dentro de mim que não pudesse ser dita e consequentemente não havia palavra alguma dentro de mim. E eu não estava escrevendo. Comecei a me preocupar com identidade. Eu sempre fora eu porque tinha palavras dentro de mim que tinham de ser escritas e agora qualquer palavra que eu tivesse dentro de mim poderia ser dita não precisava ser escrita. Eu sou eu porque meu cachorrinho me conhece. Mas será que eu era eu quando eu não tinha nenhuma palavra escrita dentro de mim. Isto era muito chato. Algumas vezes pensei em tentar mas tentar é morrer e assim na verdade não tentei. Não estava escrevendo nada.
STEIN, Gertrude. Autobiografia de todo mundo. São Paulo: Cosac Naify, 2010. Tradução de Júlio Castañon Guimarães.
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