2.9.19
espelho / mirror
ESPELHO
Sou prata e exato. Não tenho preconceitos.
O que eu vejo eu engulo de imediato
Tal como é, sem amor ou desamor.
Não sou cruel, só real,
O olho de um pequeno deus, quadrilátero.
Quase todo o tempo eu penso na parede oposta.
É rosa, com manchas. Olhei tanto tempo
Que já é parte de mim. Mas pisca.
Faces e trevas nos dividem a todo momento.
Agora sou um lago. Uma mulher se inclina para mim,
Buscando em meus traços o que ela é de fato.
Depois volta-se para as mentiras das velas e da lua.
Vejo-a que retorna e reflito-a fielmente.
Ela me recompensa com lágrimas e mãos trêmulas.
Valho muito para ela. Vem e vai.
Toda manhã é sua face que substitui as trevas.
Ela afogou em mim uma menina, e em mim uma mulher
Velha se alça para ela dia após dia, peixe terrível.
MIRROR
I am silver and exact. I have no preconceptions.
Whatever you see I swallow immediately
Just as it is, unmisted by love or dislike.
I am not cruel, only truthful.
The eye of a little god, four-cornered.
Most of the time I meditate on the opposite wall.
It is pink, with speckles. I have looked at it so long
I think it is a part of my heart. But it flickers.
Faces and darkness separate us over and over.
Now I am a lake. A woman bends over me,
Searching my reaches for what she really is.
Then she turns to those liars, the candles or the moon.
I see her back, and reflect it faithfully.
She rewards me with tears and an agitation of hands.
I am important to her. She comes and goes.
Each morning it is her face that replaces the darkness.
In me she has drowned a young girl, and in me an old woman
Rises toward her day after day, like a terrible fish.
de Sylvia Plath
in CAMPOS, Augusto de. Retrato de Sylvia Plath como artista. Traduções de Augusto de Campos. Londrina: Galileu Edições, 2018.
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