29.12.12

O Tejo



O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia,
Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia
Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia.

O Tejo tem grandes navios
E navega nele ainda,
Para aqueles que vêem em tudo o que lá não está,
A memória das naus.
O Tejo desce de Espanha
E o Tejo entra no mar em Portugal.
Toda a gente sabe isso.
Mas poucos sabem qual é o rio da minha aldeia
E para onde ele vai
E donde ele vem.
E por isso porque pertence a menos gente,
É mais livre e maior o rio da minha aldeia.

Pelo Tejo vai-se para o Mundo.
Para além do Tejo há a América
E a fortuna daqueles que a encontram.
Ninguém nunca pensou no que há para além
Do rio da minha aldeia.

O rio da minha aldeia não faz pensar em nada.
Quem está ao pé dele está só ao pé dele.


PESSOA, Fernando. Ficções do Interlúdio: Poemas completos de A. Caeiro. In: Obra Poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1986.


Um comentário:

Chaostrophobia disse...

Arthur,
Sou uma grande fã do seu trabalho.
No entanto reparei que tem uma gralha na indicação bibliográfica do poema. Não será antes: PESSOA, Fernando. "Ficções do interlúdio: Poemas completos de A. Caeiro". In: Obra poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1986. ?
Por outro lado, aqui em Portugal, é prática corrente referir-se o número do poema (o XX, neste caso) e citar como título todo o incipit "O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia".

Mais uma vez, parabéns pelo seu excelente trabalho,
Beijos,

Sarah